quarta-feira, 13 de maio de 2009

BARBA BOM DE BOLA

por André Pugliesi

Já desconfiava que o Lula era bom de bola. Pelas fotos, dava para perceber que o presidente bate legal na criança. Com estilo, corpo bem posicionado, como tem de ser. Manha certamente forjada nas peladas do passado, em São Bernardo do Campo. Calcule a quantidade de chargeadas em uma partida de torneiros mecânicos? Só sendo liso para sobreviver.

"Pega essa, goleirão!"

O que era uma impressão, virou certeza depois do encontro do Barba com o Ronaldo, ontem.

Confiram a peça audiovisual.


Agora, vamos aos fatos.

Evidência 1
Jogar bola de terno é tão ou mais difícil do que cagar nesses trajes.

Evidência 2
Controlinho de cabeça não é para rébas.

Evidência 3
Controlar a pelota no cocuruto, atrás de uma bancada, pressionado por cadeiras e diante da expectativa de dezenas de fotógrafos e cinegrafistas, só os craques são capazes.

obs: esse post não tem nenhuma conotação política.

quinta-feira, 7 de maio de 2009

THE KING OF PERERECO

por André Pugliesi

O Vascão está pela boa para contratar o Aloísio, apelidado Chulapa. Nessa sexta-feira, o atacante pinta em São Januário e deve acertar o retorno ao Brasil. Confirmada a transação, garanto: mandou muito bem o clube cruz-maltino.

Sei que tem uma rapaziada numerosa que não curte o Aloísio, posição justificada por um argumento violento: como pode servir um centro-avante que raramente marca gols?

Relaxa, moçada...

De fato, dificilmente ele vai para a rede. No entanto, são poucos os atacantes no futebol mundial capazes de organizar um perereco como o Aloísio. Chulapa na área, bola alçada, só dá zagueiro se estabacando, furada, nêgo chorando, peruca voando, o caos.

"Calma, sei o que tô fazendo

A partir daí, lembrando o ensinamento do Paulo "Larica Total" Oliveira, o "erro é o pai do acerto". São tantas as confusões provocadas pelo camisa 11 que, volta e meia, alguém vai lá e guarda.

Baita trunfo para qualquer equipe - excelente para a Segunda Divisão, aliás - graças ao corpanzil da fera, resistente a todo tipo de abalroagem e fundamental para o cabeceio, mais a grossura de seu futebol. Sim, porque marcar caneludo é tão difícil quanto anular um gênio. Ambos são absolutamente imprevisíveis com a gorducha nos pés.

Quando quem manja vem de mano, você fica na miúda, ligado pois o cara é capaz de tudo. De repente, um milésimo de vacilação e a bola se foi pelo vão...

Já quando o réba aponta (caso do Aloísio), você nem esquenta. Afinal, ele não é capaz de nada. Eis que o cabôco ousa um elástico, a bola bate no calcanhar dele, a tosquêira assusta, bate-rebate, já era...

Deu para sacar o motivo de o Aloísio provocar desespero nos adversários? Se ainda não, comprovem no vídeo abaixo, um belo apanhado de trombadas terminadas em gols do atacante.

quarta-feira, 22 de abril de 2009

COMEMORAÇÕES E COMEMORAÇÕES

por André Pugliesi

A comemoração do gol diz muito sobre o jogador. Quando o cara guarda o nenêzinho na rede revela a sua verdadeira face. Mostra que é generoso, marrento etc. E reparem, quem é craque, curte. Quem não é, vacila, e põe tudo a perder.

Um exemplo óbvio: Pelé. O negrão era tão nervoso que inventou a sua própria forma de comemorar. Partia correndo em velocidade moderada, carregando toda aquela pujança africana, saltava só o suficiente e socava o ar. Com um detalhe importantíssimo, que faz toda a diferença e corrobora a minha "tese": invariavelmente, o Edson sorria lindamente, arreganhando a dentição perfeita.

Curtição

Agora, vejam só. Esses dias, no Linha de Passe (ESPN Brasil), o Fernando Calazans observou muito bem: sempre que marca, o Diego Souza comemora com raiva. O palmeirense sai de cara amarrada, cuspindo marimbondo, jebeando, filha-da-puta da cara.

Eu sei que comparar o Pelé com o Diego é um tanto agressivo, mas o objetivo era deixar bem clara a diferença entre a celebração do craque e a do jogador comum.

Nessa mesma onda, deixei de considerar craque o russo Arshavin, do Arsenal. O que ele fez num dos tentos que anotou contra o Liverpool (foram três no empate em 4 a 4, ontem), quem conhece não faz: na cara da torcida adversária, fez o gestinho "pedindo silêncio". Quanta deselegância.

Tremenda maleducação

Pô, branquelo! Eu sei que no calor da disputa, com a galera xingando, partida pegada, rola mesmo a vontade de apavorar geral. Até explica o destempero, mas não justifica. O "diferenciado" (termo palha) não guarda rancor. Não desperdiça o momento máximo do esporte, e do atleta, dando "respostinha".

Duvido que o pai do Edinho tenha um dia vacilado dessa maneira. E olha que ele comemorou pra cacete (talvez por isso tenha adotado o soco... "Porra, Coutinho, não sei mais o que inventar, a partir de agora vai ser sempre igual e foda-se, hehehe").

Bagre também faz gol
Comemoração de craque é tema para degustação de 117 engradados de Wimi (malbec, cabernet, de todas as safras). Mas, passemos para outro tipo de celebração também interessante. Dos gênios, só se espera a alegria de quem domina a dificílima arte do futebol. Já da turma que judia a redonda, sabe Deus...

De vez em quando rolam uns esquemas fantásticos... quem viu a comemoração do Wanderley, atacante do Cruzeiro, na vitória sobre o Ituiutaba? Primeiro, não existe craque com nome terminado em "ey". E depois, só réba comemora como se fosse a última vez (até porque, vai que é).

Pelota no fundo da meta, o Wanderley pulou as placas de publicidade, lançou a camisa pra cima, deu soco no ar, levantou os braços, um autêntico pout-porri. Destrambelhamento que craque não tem. Apreciem no video do UOL Esporte...

terça-feira, 27 de março de 2007

BICHO SOLTO NA AREIA

por André Pugliesi e Rodrigo Abud


"Abud, será que é preciso passar protetor na genitália?", pergunto, faceiro por tão curiosa ignorância e, ao mesmo tempo, temeroso com as possíveis conseqüências nefastas do que estava por vir. Afinal, cruzada a porta do vestiário - reparem, unissex - o sol comandava, reinando absoluto num céu azul alucinante.

Era sabadão, quase dez horas da manhã, e nossa brodagem em nome do jornalismo geraldino era retomada na Praia do Pinho, Santa Catarina, principal ponto naturista do nosso Brasilsão de Deus.

Pouco mais de 200 quilômetros em marcha ré, eu taxiava em frente à residência de Abud, em Curitiba, capital do Paraná, no início da manhã, saudado com o cantar dos pássaros, numa preguiça desgraçada. Quase nada perto da convicção de que a aventura pelado, com nada que se tem direito, seria muito boa.

Destino: nu
Cumprimos o pequeno trecho Curitiba-Camboriú na ponta dos dedos, embalados pelo mítico rock, este ritmo insinuante que faz a cabeça dos jovens. Se não fosse por uma disputa bem pegada com um tiozão e sua senhora, a bordo de um Fiat Hundred Forty Seven creme, poderíamos afirmar que a nova matéria se anunciava numa tranqüilidade incomum.

Veloz e furioso

Pois foi só embicarmos na única entrada para o recanto naturista, estacionarmos na cancela - o parque peladeiro é dividido do “mundo normal” - para, enfim, sentir a adrenalina consumir as veias. Neste caso, reação um tanto previsível, considerando que em questão de minutos nos veríamos na responsa de chamar no Adão. Assim... tal e qual amarrar o tênis.

Sem demora, passamos as caras com a segurança que nos permitiu o acesso, facilitado pelo esquema armado na véspera. Faltava então, como obstáculo derradeiro, bater um papo com nosso contato na área: Alessandra, gerente da Pousada & Camping Praia do Pinho, estabelecimento que junto com um restaurante, reina absoluto na área.

Antes de última cancela já avistávamos, bem ao longe, corpos despidos flanando na areia. Contudo, nada comparável à cena que viria. Foi eu frear a rodonave, eis que surge de trás do muro, vindo em nossa direção, um 100% desinibido rapaz com seu pênis a pendular. Olhar absolutamente destreinado foi impossível não notar e, claro, se incomodar. Acabamos por cair numa risada extremamente nervosa, o estopim para uma possível queimada de filme que, certamente, despertaria desconfiança.

Sabendo disso, derrotamos rapidamente o choque, controlamos os impulsos e fomos digladiar com Alessandra. Prontamente, sacamos de nossas credenciais e intenções. "Olá, tudo bem? Eu sou o André, ele é o Rodrigo, somos jornalistas, essas são nossas carteiras. Sabe como é, deve pintar todo tipo de aventureiro por aqui. Viemos fazer a matéria que eu te falei ontem, lembra?", eu disse.

Vista aérea do Pinho

Sem dar muita importância, e com um ar meio cabreiro, a jovem loura seguiu o combinado e convocou Valdir Nei de Melo, 49 anos, principal autoridade do local na posição de presidente da organização não-governamental Naturistas da Praia do Pinho (ONPP). Seria ele o responsável por nos acompanhar e mastigar as informações e regras da praia.

Com o mesmíssimo figurino que ostentava há cerca de cinco meses, ele nos recebeu. Corpo rotundo de tiozão, sacão balangando bonito e na pele castigada do sol a confirmação de que ali estava, sem dúvida, o general da quebrada. Tomado o primeiro jab no round anterior, assimilamos o golpe numa boa: sem crise nenhuma conversar com um total desconhecido despido e, conseqüentemente, de arma apontada (não engatilhada) para nós.

"E aí, Valdir? Seguinte, estamos fazendo uma reportagem sobre naturismo. Gostaríamos que você apresentasse o local, como funciona etc, certo?", iniciei. No que ele respondeu. "Sem problemas. Mas tem um detalhe, nesta faixa de areia em frente à pousada a nudez tem que ser total".

Vestidos com os óculos de sol
O aviso do presidente de que a partir de então teríamos que chamar no Adão era tudo o que nós queríamos ouvir. Viajamos para isso. Mas quando a bola está na marca da cal, com o Maraca lotado, jogados 47 do segundo tempo, é impossível não rolar uma aflição. Sem contar que, em nome da promoção, do registro jornalístico, facilmente conseguiríamos uma permissão para circular com o material ensacolado.

Com o intuito de amadurecermos a idéia antes de manobra tão ousada, pedimos um break ao nosso guia e, enquanto ele retornava para a areia, fomos tomar a decisão. No entanto, nem foi preciso o parlamento, pois, com grande sensatez, Abud mandou. "Foda-se, vamos nessa".

Contraste nos bronzes

Foi nesse momento que nos deparamos com a primeira grande diferença do mundo naturista para o universo degradado, hostil, capitalista falido das aparências. Ao contrário do que geralmente acontece quando se vai desprevenido ao mar, não foi preciso descolar um mocózinho ou organizar a tradicional paredinha de toalha para trocar o modo underwear pelo bermuda (sunga não) ou biquíni. Dessa forma, fomos ao vestiário (unissex, faz total sentido), tiramos os tênis, meias, camiseta, bermuda, é um, dois, três e... pronto, óculos de sol e nada mais!

A sensação de ficar peladão em público é sinistra - vestiário é fichinha. Simplesmente, ali está você, com o aparelho genital na vitrine, e um monte de gente que sequer trocou um rápido cumprimento com a sua pessoa na escadaria do prédio, tomou um Minuano gelado na mercearia ou, sei lá, sentou ao lado no colégio - não que essas situações prosaicas sejam o suficiente para tirar a roupa na frente de alguém. No início, e em algumas bad trips no decorrer do período, é algo que parece ser a realização daqueles pesadelos em que se está nu, sem ter como se defender, no churrasco de quinze anos de formatura do primeiro grau. Contudo, voltemos aos fatos.

Era chegado o momento de Pugliesi e Abud invadirem o terreno da praia do Pinho. E, para tanto, íamos nos deparar com a segunda grande diferença do mundo naturalista. Como está na abertura desta reportagem, assim que ficamos só na carcaça, e diante dos potentes raios solares, inquiri: "Abud, será que é preciso passar protetor na genitália?". Que é necessário besuntar rosto, costas, dorso, braços e pernas todo mundo sabe. Mas alguém já ouvir falar por aí que é importante cobrir a aparelhagem se for mostrá-la ao sol?

Creio ser meio óbvio que sim. Porém, pelas barbas do profeta, não está escrito em lugar algum! Olhei no verso da embalagem e não tinha nada do tipo: "ao praticar nudismo, homens lambrecar o pênis, mulheres a vagina". Sendo assim, após a pintura básica, aplicamos uma demão ligeira nas nádegas e somente um tapa no guri. Vai que cai, melhor não mexer com o desconhecido. E assim, servidos ao óleo branco e portando apenas as lunas (exceto pelas chaves do carro, carregada na mão), fomos à procura de Valdir em seu habitat, literalmente, natural.

Formando o bonde nudista
Embicamos no corredor para a areia como se estivéssemos prestes a pisar o gramado do Estádio Azteca na final da Copa de 70 - pressão frenética com a iminência de trocar uns passes com o Crioulo. No entanto, bafejados pela sorte, avistamos a barraquinha de Valdir logo em frente, e lá nos abrigamos para um conveniente tempo de aclimatação. Eles que aguardem – ou imaginavam que ia ser fácil nos tirar pra baitola? (o que fazem dois marmanjos passeando desnudos numa área para casais?).

"Vou explicar pra vocês basicamente como é a divisão. Primeiro, lá no começo, do lado esquerdo (olhando para o mar) é livre, pode ficar ou não pelado. Pra cá das pedras é a zona de adaptação. E, da marca até o final, do lado direito, são permitidos apenas casais. E totalmente nus", mapeou Valdir, destacando que, em se tratando de um espaço público, as pessoas podem entrar e sair a hora e como quiserem. Entretanto, são aconselhados a colaborar, chamando no Adão e Eva ou, para manter a paz, ralar o peito. "Dificilmente alguém não compreende", completou.

Comum mesmo é a pilantragem querendo aproveitar a liberdade das vestes para se entregar aos prazeres do vuco-vuco. E neste caso, Valdir cresce pra cima de si mesmo numas de meganha e interpela quem estiver faltando com a ética. "Primeiro eu chamo a atenção, como no caso de uma ereção. Depois tenho que pedir para se retirar". Na manha, sempre, até porque, ali o desguarnecimento é geral.

Não tem mistério

Ciente das regras básicas, formamos o bonde para dar uma geral nas areias do Pinho. E assim nós fomos, com Valdir elogiando a beleza natural do local, destrinchando um pouco mais do manual de conduta, salientando as ações da ong, enquanto eu e Abud só naquele maroto "nossa, que legal, é mesmo", ao passo que, em nossa mente, ressoava o grito "porra, tô nude!".

Mas sabe como é, malandro. Baita brisa refrescante nas partes, o sol como testemunha, o mar azul e convidativo... com o tempo você relaxa total. Até porque, todos compartilham da mesma condição, e esse é o segredo para ficar numa boa. Além do mais, ninguém fica mirando as partes pudendas alheias – não na hard face, pelo menos.

Foi quando estávamos bem sossegados, caminhando e molhandinho o pé na água, ansiosos pelo mergulho, que Valdir nos impôs uma tarefa insana: atravessar, pelas pedras, até o outro lado do recanto naturista, onde se pode tirar ou não a roupa. É sabido que transitar pelas rochas não é simples, tem o tão temido limo, os saltos, entre outros obstáculos perigosos. Agora, que tal fazer isso sem qualquer proteção?

A poucos metros da escalada, com Valdir à frente, já começou a briga por posição entre eu e o Abud. A colocação mais perigosa já estava assumida, a de maquinista, restava agora a briga para não ser o vagão do meio. E daí ficou tipo em largada de Fórmula 1, com os carros zanzando de um lado para o outro. Seria até antiético eu revelar quem ficou na intermediária, mesmo porque durante a longa jornada rolou uma alternância, sempre com o espaço mínimo rigidamente respeitado.

Concluído o desafio, deixo a dica para os rapazes quanto ao melhor procedimento para o salto nas pedras: se for dar um vôo extenso, da última rocha para a areia, por exemplo, antes colha a bolsa escrotal com as duas mãos, como se estivesse na barreira no jogo de futebol, e aí sim se jogue. Point totalmente escaneado, e verificado que do lado de lá só havia homens e um clima de flerte gay violento, poderíamos enfim salgar o couro.

Prazer vs. Observação
A prática da natação estilo como veio ao mundo é certamente o que há de melhor. As únicas contra-indicações são o surfe de peito (o popular jaca) no raso e a constante aparição dos "peixes-moicano", quando o pessoal ergue muito a nádega para furar a onda. Fora isso, é um espetáculo ficar lá, por horas, flutuando, literalmente livre, leve e solto.

Mas o prazer teria que ficar de lado em nome da apuração. Voltamos para a areia a fim de catalogar os tipos e, assim, concluir os trabalhos. "A maioria dos freqüentadores se encontra na faixa dos 35 aos 45 anos, são casais com a família, e vindos de Santa Catarina, principalmente, São Paulo e Paraná. Mas temos muitos jovens também", nos disse depois Anílton Bitencourt, um dos proprietários e administrador da Pousada & Camping Praia do Pinho (que compreende ainda um quiosque e o estacionamento).

Apesar do pouco comparecimento do público – nossa empreitada foi realizada uma semana após o carnaval, feriado que é o top de visitação na temporada – notamos exatamente isso, filmando o movimento confortavelmente sentados em uma toalha para evitar os siris. E aí completamos o álbum de figurinhas: tinha pomba cabeluda, careca, linguiça toscana, salsichão, pepino, peito grande, pequeno, farsante, tudo bem sortido para o gosto geral.

Todos convivendo pacíficamente. Não por acaso. "Para praticar o nudismo, a pessoa tem que ter cabeça aberta, bem resolvida, o que é mais comum nessa idade", apontou com precisão, novamente, Anílton, largamente experiente apesar dos 25 anos.

A propósito, o encontro com o grande empreendedor do nudismo foi bem engraçado. Fomos informados que ele estava no quiosque, sendo assim, eu e Abud nos dirigimos até lá. No caminho, dois homens vinham no sentido oposto: um cinquentão, pança notável, cabelos e barba compridos, aquele naipe hippie clássico; enquanto, quase ao lado, um gurizote com pinta de surfista e calçado em bermudas, chinelos e camiseta. Logicamente, fomos seco no tiozão, pensando ser Anílton. Ledo engano. O simpático manda-chuva não é adepto do pintofree, segundo ele, para manter um distanciamento profissional.

A fome já castigava, então fomos almoçar. E no restaurante fora da pousada (que possui um amplo refeitório) bate aquela bad trip do pesadelo. Pois lá, fora da faixa da areia, é cada um por si, e muita gente não fica pelada. Alguns vestidos normalmente, outros de toalhinha, e poucos em pêlo. O que acarreta cenas engraçadas. Como da família almoçando muy respeitosamente, sentada na mesa, ao passo que volta e meia um pênis margeia perigosamente o prato. Coisas da vida naturista.

Feita a digestão, partimos de peito aberto para mais uma longa salgada no esqueleto, para a refrescar final. O sol já sumindo, ventinho gelando, resolvemos que era tempo de cobrir o corpo e pegar a estrada. Quase dois anos passados da última reportagem, a nova fase estava definitivamente inaugurada. A lamentar, apenas o fato de não ter rolado o incrível vôlei de praia pelado. Quem sabe numa próxima oportunidade...

domingo, 4 de março de 2007

CELEBRANDO A SACANAGEM

por André Pugliesi e Rodrigo Abud

Há 34 anos o Concurso Bem Bolada é a principal opção em matéria de putaria no carnaval curitibano. Literalmente. Para os fanfarrões de primeira viagem, e para aqueles que não são da área, o concurso elege a garota de programa mais bonita, gostosa, jeitosa, em suma, a moça mais completinha do carnaval na capital paranaense. Representantes de quase todas as boites de Curitiba e região metropolitana pisam e sambam na passarela em busca do título máximo do ramo.

Realizado no Crystal Palace, domingo de carnaval, o evento teve como vitoriosa a candidata Juliana Antonele, alegados 21 anos, representando a Sex Night Club. Entre toda sorte de tipos femininos, Juliana Antonele, sem dúvida, era uma das mais bonitas. No entanto, muito se comenta nos bastidores quanto à lisura dos resultados. Enfim, se é certo que o júri não transmite muita credibilidade, especialmente entre as concorrentes, pelo menos é composto da mais variada gama de personalidades. Constituíam o corpo de jurados do Bem Bolada 2004, gente do quilate de um Roberto Hinça, apresentador de tevê renomado, Jotapê, radialista e político nas horas vagas, contando ainda com um belo apanhado de figuras estranhas e jornalistas em estado avançado de embriaguez. A apresentação do evento ficou a cargo de Cândido de Oliveira, brilhante repórter do programa Ricardo Chab. Candinho, para os íntimos, mostrou enorme categoria na condução do concurso, fazendo às vezes de apresentador, animador de auditório e, quando necessário, comandou o rebolado das candidatas até o chão, tal qual um passista de escola de samba dos mais experientes. Só faltou o pandeiro.

Como de praxe, destaquei o intrépido jornalista Rodrigo Abud para me acompanhar na cobertura do evento. Abud, que de bôbo não tem nada, animou-se e aceitou prontamente meu chamado. Afinal, não é de se desperdiçar a chance de cobrir algo, ou alguma coisa, no funeral, perdão, no carnaval curitibano. Ainda mais numa festa de garotas de programa, onde as chances de cobertura, em cash ou não, aumentam consideravelmente. Abaixo, nossas impressões sobre o Bem Bolada 2004.

Chegando ao evento eu e Abud constatamos que, caso não rolasse o famoso trenzinho de carnaval, certamente as risadas estavam garantidas. Já na portaria do Crystal Palace a fauna humana exuberante e exótica dava o ar da graça, provando ser o Bem Bolada um evento para uma platéia selecionada. Em meio a um público majoritariamente masculino, destacavam-se tiozões exalando naftalina, jovens ouriçados e vovôs-garoto, não me perguntem como, muito bem acompanhados. Algumas moças sozinhas também decoravam o ambiente, todas com o pecado estampado na face. Mais adiante, no transcorrer do desfile, descobriríamos que não só a fauna, mas também a flora do local era bastante exuberante. Mas isso é assunto para algumas linhas abaixo.

Opositor que sou do corporativismo no jornalismo brasileiro, adentrei ao recinto sem fazer uso da minha carteira do Sindicato dos Jornalistas, a qual não possuo e nem faço questã. Paguei ingresso como todos os mortais, devidamente bonificado pelo recorte da Tribuna. Abud e eu concordamos que 10 mangos tratava-se de um preço justo para um evento de tamanha magnitude. Além do mais, quitando o ingresso estaríamos contribuindo para a manutenção do Bem Bolada como o bastião da marotagem no carnaval curitibano.

Passando pela revista, sentimos o bafo de zona que se adonava das dependências do Crystal Palace, fenômeno normal em se tratando da natureza do concurso. Em tempo, louve-se a disposição e o profissionalismo dos seguranças em apalpar uma rapaziada excitadíssima para apreciar as candidatas. Como bons pândegos, eu e Abud caímos matando na pista de dança, recepcionados pela tecnêra irada que bombava dos alto-falantes.

Depois de nos esbaldarmos com os hits eletrônicos mais cafajestes da night, bailamos ao som da banda residente do Crystal Palace. Não me recordo o nome do grupo, uma sub-banda de formatura, daquelas que tocam a nata das músicas lamentáveis do rádio para os mais novos profissionais consagrarem seu futuro desemprego. Lembro-me apenas de um belíssimo afro-brasileiro arrepiando, pra variar, no contra-baixo. Muita porcaria e algumas saudosas marchinhas depois, Cândido de Oliveira subiu ao palco para dar início aos trabalhos do Bem Bolada 2004.

Candinho, a fogosa Kendrya e Madrinha abusada
Estrategicamente posicionados à beira do palco, não contávamos com a desorganização do evento. Com muita educação, é verdade, Cândido de Oliveira solicitou que a massa ereta que tomava conta da pista sentasse no chão para não obstruir a visão dos cafetões, digo, do pessoal das mesas que estava atrás. Diplomaticamente acatamos as ordens de Candinho, afinal, ainda assim teríamos uma bela visão do desfile. Mas tinha mais. Mostrando que tudo havia sido minuciosamente planejado, a organização ordenou que a plebe, digo, o pessoal sentado no chão se afastasse para dar lugar às mesas dos jurados. Com a mesa do júri à frente ficaríamos com a visão deveras prejudicada, não podendo relatar com fidelidade o desfile, sendo assim, fomos obrigados a descolar um espaço mais adequado.

Terminados os reparos logísticos, Candinho chamou ao palco Kendrya, uma menina muito extrovertida que as más línguas diziam ser prostituta. A moça subiu ao palco para divulgar seu ensaio de fotos ousadas para a revista Área Vip Brasil e, para o deleite da audiência, aproveitou o ensejo e proporcionou um preview do conteúdo editorial. Me senti num fim de feira, onde melões eram disputados avidamente e até um bacalhauzinho sobrou pra alegria turma.

Para entreter e aplacar a ansiedade do público, Candinho usou e abusou dos dotes sambísticos da Madrinha do Bem Bolada. Entre os mais diversos agradecimentos, a moça dançou sem parar no aguardo da preparação das candidatas. Há duas horas dançando desnuda ao lado de Candinho no palco, a Madrinha não escondeu a expressão de insatisfação ao ser convocada pelo apresentador a dançar mais um pouquinho. Ciente do descontentamento da estafada passista, mostrando incrível perspicácia e atenção aos mínimos detalhes, Candinho soltou a pérola da noite...

"Que beleza, já tá de topless..."

Depois dessa, restou a Candinho anunciar, com pompa e circunstância, os responsáveis pela escolha da legítima representante da noite curitibana. Com os jurados em seus lugares, a plebe espremida e as torcidas animadas, finalmente, foram chamadas as concorrentes.

Demorou, mas valeu a pena. Um sem fim de plumas, paetês, purpurinas, nádegas, seios e genitálias semi-desnudas descortinaram-se perante os olhos atônitos da platéia. Pura luxúria, marotagem e saliência. Um espetáculo erótico-carnavalesco empolgante e divertidíssimo.

E dá-lhe mexe-mexe, bole-bole, sobe-e-desce, desce-e-sobe. Todas as candidatas tiveram a oportunidade de exibir seus dotes artísticos e genitais para os jurados. Primeiro, coletivamente. Depois, em vôo solo. Sambaram à vontade. Afinal, para uma escolha de tamanha envergadura, faz-se necessária muita atenção nos mínimos detalhes. E para uma melhor visualização dos detalhes, algumas candidatas mais vagabundas, digo, desesperadas, digo, um tanto quanto exaltadas, não se contentaram em exibir apenas a malemolência no samba, exibindo-a também em outras partes do corpo. Aliás, se não fosse por essas meninas festeiras que apresentaram CIC, RG e comprovante de residência na passarela, o Bem Bolada não passaria de um concurso de beleza comum.

Eu nem precisaria dizer que a o público ia a loucura com as meninas mais afoitas. Inclusive, não posso deixar de destacar um bróder que estava ao nosso lado, trajando uma camisa social branca não muito passada, de vistosa cabeleira black que a todo momento ordenava com incrível intimidade: "Cândido, manda elas tirar a roupa!".

Finalizado os desfiles, as candidatas recolheram-se aos suntuosos camarins do Crystal Palace para aguardar a apuração dos votos. Não demorou muito e o resultado veio à tona sem grandes surpresas. Bianca, do Café Paris, foi eleita Miss Simpatia. A eleita para Segunda Princesa foi Patrícia Guedes, do Café Paris. Por último nos prêmios de consolação, Priscila Veiga, do Saara Café, faturou o título de Primeira Princesa. Interessante notar pelo resultado como os cafés de Curitiba estão a cada dia com atrações mais ousadas.

Juliana, a grande vencedora

O tão aguardado resultado do Bem Bolada 2004 veio logo a seguir. Cercado pelos jornalistas, Candinho anunciou Juliana Antonele como a Bem Bolada do carnaval 2004. A moça, bastante contida e tímida, posou para as lentes dos fotógrafos, deu entrevistas, mas não atendeu ao apelo da platéia por um algo mais. Manteve-se vestida mesmo nos momentos de euforia pela conquista do título.

Chegava ao fim o tradicionalíssimo concurso Bem Bolada. Alguns reclamavam do excesso de pudor da maioria das candidatas. Eu e Rodrigo Abud ainda atordoados pela estréia no fantástico mundo da putaria momesca, deixamos para repercutir o concurso com mais calma e, tranqüilos, relatarmos a experiência para vocês.

Como já disse, exceto por algumas meninas mais acaloradas, não se confirmou a putaria generalizada que parecia ser a tônica do concurso. Como profundo conhecedor da folia brasileira, posso garantir que as chances de deixar o vovô, a vovó e a menina ingênua morrendo de vergonha com o carnaval são bem maiores em qualquer praia do Brasil. A profusão de danças sexuais e versos chulos no Bem Bolada é infinitamente menor. A diferença é que o Bem Bolada é um concurso onde a rapaziada deixa a hipocrisia de lado e celebra pacificamente a sacanagem há 34 carnavais.

terça-feira, 20 de setembro de 2005

ENCAÇAPADOS NA QUEBRADA

por André Pugliesi e Rodrigo Abud

Sempre que eu e Abud partimos rumo ao desconhecido carregamos uma máxima: independente do resultado da empreitada – seje bom, seje ruim – o importante é preencher o livrinho da vida. O que não pode é apontar na reta de chegada com um pocket book debaixo do braço. Tem que ter história pra contar. E isso não nos falta. Nossa parceria já rendeu páginas e mais páginas, boa parte delas aqui publicadas. Teve de um tudo. Geral chamando na hands num cinema pornô, xoxação desenfreada numa casa de swing, salves no encontro Racional, fervo na pista da melhor idade, entre outras peripécias. Tantas emoções, porém, poucas comparáveis as que eu destrincharei na seqüência para vocês. Segue o baile...

Abud mandou a pauta pelo msn: participar de um torneio de sinuca modalidade bola oito. Até aí, grandes merda. Mas aguardem. A parada tinha tudo para ser nervosa a começar pelo local de sua realização, a Associação de Moradores Moradias Cajuru. Traduzindo para quem não é da área, o Cajuru é o bairro mais violento de Curitiba, seguido de Boqueirão, Cidade Industrial e Sítio Cercado. E embora soubéssemos desse fato desde o princípio, só ligamos o nome à pessoa quando pintamos nas redondezas. Mas voltemos. Outro aspecto que indicava para uma matéria interessante tratava da premiação: 500 reales para o campeão, 250 para o vice, 150 para o terceiro e 100 para o quarto. Não que nós pretendêssemos engordar o numerário – dada nossa total inexperiência no assunto - mas jogar valendo dinheiro teria um gostinho pra lá de especial. Para nós então - que rasgaríamos gloriosamente os 20 mangos da inscrição - seria uma delícia. Então fechou a questã. Dia 10 de setembro eu e Abud voltaríamos às ruas.

Colocando as bolas na reta
Nasceu o sábado – com a capital paranaense lindamente ensolarada – e eu telefonei para o parceiro a fim de acertarmos a diligência. Foi quando ele me informou que alguns participantes do certame estariam num determinado bar, aquecendo os tacos entre um chocomilk e uma Sete Belo. Localizado na República Argentina, avenida que faz parte do itinerário costumeiro de Abud, o boteco foi o grande responsável pela idéia da matéria. Voltando para o lar num dia qualquer, Abud visualizou um chamativo cartaz de divulgação e teve o estalo. Como o início da competição aconteceria somente às 19 horas, desembarcamos no ponto de encontro ao final da tarde para nos adonarmos do clima de um torneio de bilhar de alto rendimento. Só não contávamos com a decepcionante audiência, encontravam-se no local meia dúzia de dois ou três bêbados. Mas foi coisa de Deus. Só por ele, a mesa de sinuca estava vazia e pudemos azeitar as articulações cutucando as pelotitas coloridas. Três fichas e algumas Wimis depois, nossos perfis como atletas de bilhar eram os seguintes:

André Pugliesi – Nas três partidas abriu larga vantagem. Deu chapéu, pedalou, bola no meio das pernas e drible da vaca no começo. Porém, sucumbiu nos minutos finais nas três oportunidades. Jogo pouco consistente.

Abud, esquentando o tamborim

Rodrigo Abud – Começou muito mal três vezes, mas virou nos últimos instantes. Compensou o ataque deficiente com uma boa defesa. No entanto, assim como André, praticou um jogo sem consistência.

Preocupados com a possibilidade de desclassificação sem encaçapar uma única bola, emendamos uma resenha com o dono do estabelecimento, que também participaria. Teríamos alguma chance? João Santos amenizou. “É muito bem disputado. Tudo pode acontecer”. A nosso favor, o fato das mesas serem pequenas, o que sabidamente amplia as chances dos jogadores de pouca técnica e muito vigor. Cientes da impossibilidade de faturar o cascalho, alimentamos a idéia de quem sabe meter duas bolas na trave, caprichar no chuveirinho, dividir todas e nos retirarmos honrosamente perdendo de pouco. Para completar o vislumbre, questionamos João sobre os favoritos. “Tem gente muito boa que vai participar. Acho que Grilo e Carlão são os com mais chances de vencer”, apontou.

Dono de bar e ostentando uma boina branca no melhor estilo Rui Chapéu, João Santos não chamou pra si a condição de cover do mestre sinuqueiro, justificando a inclusão dele fora dos possíveis vencedores. “Eu vou mais para participar. Devo ir lá pelas oito horas, se quiserem levo vocês lá”. Agradecemos a gentileza, mas novamente, decidimos antever o lance, ingênuos na pretensão de encontrarmos facilmente a associação de moradores.

Trutas e quebradas
Foram necessários três pit stops de informações para sabermos que ainda tinha muito chão pela frente. Era preciso descer a Luiz França, virar à esquerda após o depósito de gás, virar à direita dois cruzamentos adiante para então seguir cinco quadras até o destino final. Até a última entrada a rodonave escorregava macia na via asfaltada. Entretanto, quando avistamos a rua João Crissóstomo da Rosa, o Bronx se adonou da paisagem. Uma viela estreita, chão batido, muitos bares e igrejas, rapaziada pela rua em meio às casas amontoadas. Abud cravou. “Broncas legais!”. Confesso que a crença no brasileiro humilde e ordeiro se misturava ao temor de nos tornarmos os Tim Lopes da juventude. Sabe como é, hoje em dia é preciso desconfiar de tudo, da alta roda e, naturalmente, onde a turma está a perigo. Mas não dá nada, mergulhamos em busca do número 200 e o encontramos quase no final do caminho, vizinho de uma pracinha típica de periferia.

Fuca-bala fazendo a contenção

A Associação de Moradores Moradias Cajuru não difere de nenhuma das milhares de associações de bairro Brasil à fora. Um galpão modesto de fundos, mesas e bancos compridos de madeira espalhados. Ao centro, lá estavam as estrelas da noite: três mesas de sinuca confeccionadas pelos bilhares Celli. E a moçada estava se pegando bonito nas tacadas. Mas só por esporte. Em volta de cada mesa, 10, 15 homens travando jogos de curta duração e alta intensidade. Sem demora, eu e Abud fomos até a mesa de inscrição: 20 reales uma chance no campeonato, 30 duas. Conscientes, ficamos com uma. As tratativas foram com o segundo João da noite, Joãozinho, o organizador da brincadeira de perder dinheiro. Simpático, nos tranqüilizou geral. “A rapaziada vem mais para se divertir. É sossegado. E lá fora deixei um menino meu pra cuidar dos carros”, revelou o cabeça. Quanto ao jogo - embora fosse pouco provável que alguém ali estivesse disposto a marotear com 500 pratas na berlinda - baixamos a guarda e ficamos mais à vontade.

No celular, Dude Munhoz chamando. Colunista do Bule e catedrático em punk rock, Dude comporia o staff do Jornalista de Merda no evento, e carecia de dicas para nos encontrar. Depois das informações mais lazarentas possíveis, eis que minutos depois ele adentra faceiro ao recinto. O vô de Dude tinha mesa de sinuca em casa, o que gabaritava o netinho a ser nosso ponta-de-lança. Lamentavelmente, contrapondo à alegria de sua presença, veio logo a decepção. Devido a um compromisso posterior, nossa grande esperança ficaria de fora. Sem Dude, as chances de promovermos um brilhareco ficaram reduzidíssimas. Enfim, iríamos de prata-da-casa mesmo.

A preços justos, eram oferecidos quitutes e bebericos, gentilmente servidos pelas crianças da área, tirando onda de garçons. No entanto, preferimos um regime severo para não ter que lidar com algum imprevisto de ordem intestinal na hora de mostrar o pau e matar as bolas. Já Dude, agora na condição de técnico, não se fez de rogado e degustou a popular carne assada. E aprovou. “Muito bom. Tradicional tempero de igreja”, avaliou o professor.

O Maraca da sinuca

Mas o tempo passava e nada. Não víamos a hora de nos digladiarmos no feltro verde. Inscrições mil, entra e sai de pessoas, vanerão rachando as paredes, sauna de cigarro e bolas espocando sem parar aditivavam a ansiedade. Sem contar as diversas figuras caóticas que apareciam e desapareciam, tornando o ambiente tenso em alguns momentos. Menos mal, em se tratando do público, o melhor estava por vir, segundo João Santos. “Depois da meia-noite começa a chegar mulher bonita”, disse. Era a promessa, já que até o momento poucas moças perfumavam o ar carregado de cana, cigarro e tosqueira.

Depois de corridas quase duas horas de espera, finalmente o bagulho ia ficar frenético. João cresceu na organização e chamou o sorteio. Eram mais ou menos 28 inscritos. Os que não eram donos de bar, eram amigos do dono. Resumindo, de zé mane só eu e o Abud mesmo. Em cima de uma mesa, burburinho rolando, veio o primeiro nome a pular da cumbuca: André! Não pasmei. Seria surpreendente se meu nome saísse por primeiro para ganhar algum tipo de prêmio. Nesse caso, normal. Que fase. Segundo nome: Mário! Pronto, estava configurada a primeira eliminatória. Sem demora, Dude Munhoz surgiu me oferecendo um taco já devidamente auferido no teste de rolagem sobre a mesa. Aceitei e já fui criando intimidade com meu instrumento. Soou a convocação e eu atendi imediatamente. Mas não é que o tal Mário, aquele, simplesmente escafedeu? Pensei comigo, um a zero pra mim no W.O. e já estou no lucro. Até que se desfez o mistério. O garrancho pariu um Mário, mas era Márcio, simplesmente um dos organizadores do torneio.

Me mata de vergonha
De canto de olho eu já tinha observado o estilo de Márcio, e me chamou a atenção algumas bífas que ele tinha desferido. Tacadas que se fossem dadas por mim as bolas seriam lançadas para fora do estádio. Espertamente, cheguei no adversário para tentar arrefecer os ânimos. “É a primeira vez que participo de um campeonato, vim mais pra ver qual é. Até porque não jogo nada”, comentei. No que fui secamente respondido. “Tranqüilo, não tem problema”, disse meu oponente. É claro que teria problema. Para mim, óbvio. E tentando posterga-los o máximo possível, trabalhei para que Márcio desse a tacada tradicional de estouramento das bolas. Afinal, malandro que é malandro não estoura. Agredidos, os números se espalharam pela mesa e era chegado o momento do meu lance inaugural. Espalhei o giz com malícia no biquinho e fui pra dentro. Resultado: espirrada clássica! Foi quando tombou meu jipinho. Eu já não tinha o handicap técnico, e agora perdia totalmente o psicológico. Pra piorar, no meu box, Dude e Abud – aqueles que deviam me apoiar – choravam de rir do début vexaminoso.

Pugliesi, sendo abatido

Márcio não teve piedade e voltou esvaziando a mesa. Uma, duas, três, quatro, cinco bolas em seqüência na caçapa. Digamos que a partida havia se tornado um tanto quanto complicada para a minha pessoa. Sem pânico, chamei na humildade e passei a vez. Meu objetivo agora era humildemente acertar as bolas. Só. Não mato as minhas, mas também não entrego pra ele. Tática que não era tão simples. O nervosismo produzia suor e o taco não deslizava entre os dedos. Mas finalmente, Márcio pôs a bola oito pra dormir sacramentando meu primeiro revés. Com a disputa em melhor de três fomos para o segundo e derradeiro embate. Desta feita, não tomei uma tunda, mas sim uma piaba. Mas nada que tenha ofuscado minha única bola matada nos dois confrontos, produzida por acaso num belíssimo telefone. Bati na três que chocou-se com a sete que carregou meu alívio pela canaleta do túnel. Missão cumprida. Ao natural, meu algoz finalizou a partida e dirigiu-me cumprimentos cordiais.

Farofa passou a lingüiça
Eliminado, fui para a arquibancada e assumi a reportagem fotográfica. Com a palavra, literalmente, a bola da vez: Rodrigo Abud. Ele conta como foi...

Eis que vem à tona o meu jogo. Iria enfrentar o Farofa, um adversário marrento que atuava com uma luva preta sem dedos na mão esquerda. Todo cheio de nove hora. Não quis nem saber e fui pra cima, já que não tinha nada a perder. A grana da minha inscrição estava nas mãos dos organizadores e só me restava fazer pose de jogador profissional. Começo da partida - não vou negar -estava um pouco nervoso, afinal, nunca tive mais do que três ou quatro pessoas observando minha arte de desempenhar bola oito. No torneio o público era grande, e ainda tive o azar de cair na mesa principal, que apelidei de Maracanã, pelo fato do povão estar fervendo ao redor. Para me precaver, encostei no jovem e solicitei. “Vai de leve”. Bolas estouradas, minha primeira tacada foi forte e certeira, bola seis na caçapa do canto. Senti que o adversário tremeu na base, vendo o dinheiro da sua inscrição, assim como o prêmio, batendo asas. Tanto que retrucou. “Vai de leve você”, espantou-se Farofa. Mas como toda máscara tende a cair, a minha caiu em seguida. No decorrer da peleja só bati bola, enquanto o Farofa ia fazendo das suas e guardando na caçapa. Até tive chances de emburacar mais as meninas, mas parti para o estilo violento e não obtive êxito. Resultado: o adversário matando a oito e eu com seis bolas na mesa.

Segundo jogo, agora com o Farofa mais tranqüilo, sabendo que eu não era de nada. E dessa forma minhas chances foram menores. Para vocês terem uma idéia, talvez a melhor jogada que fiz foi uma tacada em que a branca passou raspando em duas bolas minhas, sem encostar, e caiu na caçapa. Coisa de quem sabe. Fui ficando desmotivado com a eliminação cada vez mais latente, tanto que a única bola que guardei foi em razão de um erro do adversário. Definitivamente, um jogo sem graça para o público e para mim, que tomei uma verdadeira sova. Novamente o resultado que todos esperavam, Farofa rolando a oito para a caçapa e eu definitivamente fora.

Bateu a deprê
A decepção de quem pagou pra participar de uma suruba com as coelhinhas da Playboy e não conseguiu nem ficar pelado se abateu sobre nós. Os olhos marejaram. A voz de Luciano do Valle que ecoava em nossos ouvidos e explodia em nossos sonhos - como nas narrações dos feitos de Rui Chapéu e Roberto Carlos na Bandeirantes - foi sumindo pouco a pouco. E sumiu. O Cajuru emudeceu. O pênis desceu. A fome bateu. A lágrima desceu. Não nos restava outra alternativa que não nos retirarmos à francesa pelas portas do fundo. Contudo, surpreendentemente, um incrível fenômeno de socialização tomou conta do ambiente antes de nossa partida. Tal qual um site bemnafoto underground todo mundo quis eternizar o momento com os dois jovens forasteiros.

O cartaz, registro histórico

Para piorar, segundo os especialistas, o ganhador seria conhecido somente no começo da tarde de domingo, e como eu e Abud estávamos na função desde às 17 horas, não teríamos condições de suportar a maratona. Lamentável, claro. As latas de Kaiser vazias se multiplicavam, a competição se acirrava, e a madrugada prometia fortes emoções. Infelizmente, tivemos que nos despedir da rapaziada, desejamos sorte e puxamos o carro. Lá fora, tudo em paz na quebrada e tudo em ordem conosco. Cravada na mente, a curtição de uma noite marota de sinuca.

O Rei do Cajuru
Conforme combinado, ativei meus contatos pra saber do desfecho do torneio. Primeiro, João Santos reportou. “Fiquei em sétimo, ganhei oito partidas. Quando a gente ganha é uma adrenalina fora de série, mas quando perde bate o desânimo. Saí de lá meio-dia morto de cansado. Não sei quem venceu”. Ficou a pergunta, que seria respondida pelo organizador Joãozinho na ligação seguinte. A disputa terminou às quatro horas da tarde de domingo, com impressionantes 1200 minutos de duração. Tudo na santa, mesmo quando o álcool e o sono castigavam sem dó a moleira. “A organização foi uma beleza, sem problema nenhum”, contou Joãozinho.

Mas de uma vez por todas, quem ganhou? Você deve estar se perguntando. Então toma. “Foi o Márcio”, saciou o organizador do evento. Obviamente, aqui cabe um parêntese. Um insight que finalmente bateu ao saber do resultado. Quando o nome de Márcio chegou aos meus ouvidos tudo finalmente fez sentido. Eu sei, nunca fui um artista no manejo dos tacos, mas algo me dizia que a minha precoce eliminação no sábado haveria de ser escrita nas estrelas. Oras, perdi para o campeão! O que numa conta simples crava meu nome na posição de segundo colocado na prática. É, amigo. Os Deuses da Sinuca gostam de uma peraltice. Reservaram para a primeira rodada, quando ninguém imaginava, a verdadeira final. Vencendo a íngrime subida que encontrou em mim, Márcio pôde sossegar e descer na banguela o caminho rumo ao título.

Com o dono dos 500 reais ao telefone, provoquei. “Senti que forcei você a melhorar muito na primeira rodada. E isso te garantiu o título, né?”. Simpaticamente, Márcio respondeu. “Pois é, foi por isso que consegui ganhar”. E a grana conquistada não vai reforçar o orçamento da fera, mas sim alimentar mais partidas valendo dinheiro. “Eu me considero jogador profissional. Só jogo apostando. E como estou sempre na ativa ganho mais do que perco”, revelou. Além de Márcio, chegaram nas semifinais Miguel, Adílson e Luizinho, com o último sendo derrotado na grande decisão. “Ele cometeu um vacilo, eu matei minhas bolas adubadas, descolei a oito e pronto”, explicou Márcio sobre o segredo da vitória.